O setor da construção civil deverá fechar o ano com um desempenho negativo de 3,5%, segundo as projeções da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Será o quarto ano consecutivo de retração do setor e, caso se confirme este ano a projeção de 3,5%, haverá uma queda acumulada de 16,3% desde 2014. A estimativa da Fundação Getúlio Vargas é ainda mais pessimista do que a projeção que consta do Relatório de Inflação do segundo trimestre divulgado pelo Banco Central, de uma queda de 2,1%. A construção civil sente os efeitos do fraco desempenho da economia em geral, do desemprego e da limitação do crédito ao longo do primeiro semestre deste ano.
A nova projeção, divulgada na reunião de conjuntura do Sindicato da Construção (Sinduscon-SP), no último dia 22/8, foi apresentada pela economista Ana Maria Castelo, coordenadora de estudos da construção da Fundação Getúlio Vargas (FGV).
Segundo Ana Castelo, a revisão das projeções, que normalmente é feita uma vez no ano no início do semestre, registrou mudança de forma gradual considerando a quebra de expectativas decorrente da crise fiscal.
“Este ano, pela questão da incerteza da economia, a gente acabou postergando essa revisão para agosto e nessa nova projeção foi incorporada a mudança de cenário determinada por uma deterioração muito maior das contas públicas”.
Ana Castelo ressalta que no final do ano passado e início deste ano havia uma expectativa de crescimento de 0,5% para o PIB da construção em 2017, algo muito próximo de uma estabilidade. A projeção de crescimento tinha como fundamento a retomada de obras de infraestrutura paralisadas do PAC (Portaria 348, de 14 de novembro), novas contratações do Programa Minha Casa, Minha Vida (PMCMV), o avanço do programa de concessões e licitações e a melhoria da confiança do segmento empresarial que começasse a refletir nas decisões de investimentos, a partir do segundo semestre.
A continuidade e aprofundamento da crise política, contudo, alterou o cenário de melhora das expectativas e trouxe mais incertezas que afetaram a decisão de investir. “As contratações do Minha Casa, Minha Vida (MCMV) estão muito aquém do previsto – até junho o programa contratou menos de 30% das metas do ano. O PAC está sofrendo contingenciamento severo e a queda na arrecadação também está afetando os investimentos dos estados”, explicou.
Situação fragilizada das empresas
Mesmo em um ambiente de incerteza da economia o MCMV tem um importante papel, segundo a economista da FGV. O que “a gente está vendo é que a situação no mercado está menos ruim por conta das obras contratadas anteriormente”.
A revisão da sondagem da Fundação levou em conta ainda as expectativas de recuperação das empresas, que não se confirmaram. A previsão era de que novas obras viessem reforçar o andamento do programa, mas as metas estão muito aquém do que foi originalmente anunciado e confirma a própria situação fiscal dos estados e municípios, na avaliação de Ana Castelo.
Dados do Ministério das Cidades apontam que em 2017 foram contratadas 150 mil unidades habitacionais no âmbito do Minha Casa, Minha Vida, sendo apenas 4,3 mil na Faixa 1; 120,7 mil na Faixa 2 e 25 mil na Faixa 3.
Emprego na construção
Os números do emprego evidenciam uma outra face do quadro de queda na atividade setorial. No caso do emprego com carteira assinada, a sondagem da Fundação Getúlio Vargas prevê uma queda acumulada de 11,1% em 2017, enquanto que no início do ano a projeção estava entre 7% e 8 %.
“Até o meio do ano temos uma queda do emprego com carteira, mas há alguns indicadores da economia que registraram uma pequena melhora, principalmente na área de consumo”, avaliou.
O saque das contas inativas, na avaliação de Ana Castelo, serviu para dar um alívio no endividamento das famílias e em alguma medida no consumo. Para ela, o comércio de material de construção foi um dos únicos segmentos dentro da cadeia que exibe um resultado positivo em 2017.
São aspectos, segundo a economista da FGV, que de certa forma aliviam o cenário, mas no caso da projeção de materiais ele está tendo pouco impacto porque há ainda muito estoque, então o efeito na indústria de materiais ainda não é na mesma magnitude do que está acontecendo no comércio. Ela avalia que enquanto o comércio registra um resultado positivo, a indústria de materiais ainda apresenta resultado negativo em 6,8% no acumulado até junho de 2017, contra o mesmo período do ano passado.
No caso das vendas de materiais de construção a variação acumulada é positiva em 4,7% até junho de 2017, contra o mesmo período do ano passado.
“A situação é menos ruim do que no ano passado. Aparentemente, o fundo do poço já foi alcançado e a gente já vislumbra possibilidades, mesmo assim, ainda muito tênues que podem não se concretizar”, frisou.
Investimentos ficam para 2018/2019
A piora da situação fiscal dos estados e municípios levou o governo também a uma revisão dos investimentos. Mas, no caso das obras do PAC, o impacto é muito mais significativo, porque “o ajuste das contas é sempre feito em cima dos investimentos”, diz Castelo. “A nova rodada de leilões não tem impacto na atividade deste ano. Se tudo der certo, você vai ter o início dos investimentos no final do ano que vem e em 2019”. Segundo ela, o investimento em infraestrutura leva um tempo, porque tem que realizar os projetos. Hoje, o que está afetando é o contingenciamento no orçamento, obras não realizadas, não cumpridas e é isso que está afetando a atividade do setor.